Um luto nunca se parece com outro; e mais ainda porque o luto não é um sentimento, é um turbilhão deles. A cada momento, os sentimentos diversos (e conflitantes, e contraditórios) se rearranjam em uma composição diferente e inesperada. O luto, enfim, é uma tempestade dentro do coração. A maioria de nós consegue sim, resistir a essa tempestade; assim como cada luto é único, cada individuo parece também dispor de estratégias próprias para conviver com o luto até que ele amaine. É comum que na tentativa de confortar o enlutado, as pessoas que o cercam, os profissionais de saúde e os livros de autoajuda proponham receitas (deve-se falar sobre os sentimentos, e não guardá-los; deve-se agir, e não cair na introspecção; deve-se pensar nos que ainda estão vivos, e não em quem se foi. O que estudos recentes indicam, porém é que essas regras podem ajudar alguns enlutados, mas não todos, nem qualquer um. Quando funcionam é mais por acaso estatístico do que por solidez científica ou empírica. Há uma crença generalizada de que o luto é uma espécie de tarefa, algo que é preciso enfrentar, trabalhar, digerir e abraçar. Salvo exceções, o luto não requer que o enlutado brigue com a dor ou consigo mesmo. Se ele se entrega ao desespero em toda a sua intensidade ou "ausenta-se" de si e de seu entorno, se prefere falar ou calar, ainda que as aparências sugiram o contrário, cada um de nós tende a responder de maneira mais eficaz possível aos instintivos da sobrevivência psíquica e da superação. São muitos os aspectos que influenciam o caminho que o luto vai percorrer. O mais importante deles é a intensidade do vínculo que se mantinha com a pessoa falecida: quanto mais amor, mais dor. Processar todos os fatores das circunstâncias da morte é árduo, infinitamente dolorido e demorado, e também é normal.
*Resumo da matéria da Revista Veja (23 de fevereiro de 2011).